Sem passaporte; sem votar!

Imagine alguém que tem medo de tudo! Que checa mil vezes se está com a passagem, os documentos, o dinheiro e tudo mais quando está viajando. Que chega duas horas antes na estação de trem, só para garantir!  Assim é um amigo que viajava comigo pela Europa há muitos anos atrás.
Ainda nem se pensava na Comunidade Européia e passar de um país para o outro era uma grande dificuldade. Uma “aventura” que podia ser difícil ou mesmo constrangedora.
Depois de muito viajar, no último dia de Itália, fomos de trem até Valensa Po, na região de Piemonte visitar mais uma feira de negócios. Chegar de trem na cidade foi fácil o difícil foi descobrir que a cidade não tem taxi e que se quiséssemos um, deveríamos ter pedido no dia anterior em outra cidade vizinha! Resumo: dia frio de sol; quatro quilômetros de caminhada estrada acima. Valeu o esforço! A feira era belíssima, ótimos contatos. Comida maravilhosa, algum vinho nacional para nos aquecer e uma carona de volta a estação de trem, de um apiedado empresário.
Retornamos a Milão por volta das sete da noite, fartados com as paisagens encantadoras da região e com as muitas castanhas assadas, que inclusive chegamos a ver aos montes em todas as paragens.
Com o tempo a nosso favor, e o frio tendendo a piorar, nos abrigamos em sala aquecida da Stazione Central.  Às onze da noite partiria o trem que nos levaria a Alemanha. Tudo certo até eu descobrir que havia perdido meu passaporte. Primeiro administrei o pânico do meu amigo: na Europa sem documento; naqueles tempos difíceis, etc, etc, etc... Imagine o que ouvi!! Depois, solucionei friamente: trocamos a passagem, nos instalamos em um hotel e no dia seguinte... pensamos no que fazer.
Detalhe: era sábado e isto poderia significar mais que um dia de atraso em nossos planos. Trocar a passagem tudo bem. Agora conseguir hotel sem reserva em Milão em qualquer época do ano é como ganhar na loteria. Nem espelunca, nem cinco estrelas. Procuramos por mais de uma hora em mais de dez hotéis. Nada! Chegamos num cinco estrelas e o atendente informou: “- Acabo de receber uma desistência!” Olha a sorte do nosso lado. Banho quente, cama e só no dia seguinte pensar no assunto. Parecia reconfortante a situação quando o rapaz pediu: “- Passaporte dos dois.”
Imagine minha expressão. Com o meu pouco italiano me expliquei e ele foi inclemente. “- Vocês tem uma hora para ir a delegacia, registrar a ocorrência e retornar com o documento provisório para poder se hospedar.” Depois desse tempo, nada de reserva.
Naturalmente a delegacia estava cheia. Todos os policiais só falavam italiano e todos os documentos estavam em italiano. Rezei e preenchi tudo como pude. Com aquele documento em mãos eu era impedida de sair da região, do país e tinha que me apresentar a cada vinte e quatro horas na delegacia, mas pude me hospedar no hotel. Consegui falar com um amigo milanês que estava hospedado na casa de amigos e ele se dispôs a ajudar. No dia seguinte era domingo de eleição presidencial no Brasil e por sorte eu poderia ir ao Consulado pedir um novo passaporte.
Deixei de votar naquele ano; consegui encontrar meu passaporte em Valenzia. Ganhei meu alvará na delegacia e o carimbo de “fichada” na polícia italiana ficou de fora do passaporte.

3 comentários:

Anônimo disse...

Coloque UUUFFFA!!! nisso.....

...É admiravel, a sua facilidade de expressessão. Parabéns outra vez.

Toshiko Hama

Viviane disse...

Mais uma vez nos brinda com uma deliciosa história, quero mais...

Anônimo disse...

Boa recordaçao ao ler este texto, prncipalmente para quem conheceu a história on line. A palavra que apavorava o amigo estressado era "Questura" di polizia.
Bj
Ruy

P.S. Estamos em Santiago

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